A Imitação de Cristo

O livro mais famoso de Tomás de Kempis, mundialmente conhecido e apreciado como uma das joias mais preciosas da literatura cristã de todos os tempos, é intitulado Imitação de Cristo. Sua importância e influência na história da espiritualidade é enorme.

Conservam-se dele 355 manuscritos e 292 edições de incunábulos ou semi-incunábulos. Desde 1617 até 1862 foram feitas, segundo Becker, 2.214 reimpressões. Atualmente calcula-se que passam das 6.200. O que supõe que tenham sido lançadas à luz pública cerca de quarenta milhões de exemplares. Foi traduzida para mais de 65 línguas e dialetos (cf. Becker, Essai bibliographique sur le livre “De imitatione Christi”. Liége: 1864).

Este livro genial foi lido por inumeráveis santos, entre os quais consta expressamente São Thomas More, Santo Inácio de Loyola, São Felipe Neri, São Luíz Gonzaga, São Francisco de Sales, São Carlos Borromeu, São Roberto Belarmino, Santa Teresa d’Ávila, Santa Bernadete Sourbirous, Santa Teresa de Lisieux, etc.

Foi recomendado por muitos Papas, como Alexandre VI, Paulo IV, Pio V, Pio XI, João XXIII. Literatos, homens de ciência, teólogos de todas as escolas e outras insignes personalidades encheram-no de elogios. Alguns lhe consideraram o melhor livro do mundo depois da Bíblia.

O estilo da Imitação de Cristo é vigoroso, apodíctico, cortado em sentenças lapidares. Ao mesmo tempo está pleno de cadências musicais e de assonâncias e rimas. É doce e efusivo. Carece de ordem lógica e de uma estruturação dialética metódica. Uns livros podem ser separados de outros, pode-se alterar a ordem, sem que por isso o todo perca a unidade estrutural que não tem. O próprio fenômeno se dá na distribuição dos capítulos. Mais ainda: se pode alterar ou suprimir muitos parágrafos, muitas sentenças, e o livro permanece.

Consta de quatro pequenos tratados de desigual extensão. O primeiro se intitula “Avisos úteis para a vida espiritual”; o segundo, “Avisos para a vida interior”; o terceiro, complemento do anterior, se intitula “Livro da consolação interior” e, finalmente, o quarto (terceiro no manuscrito) “Devota exortação para a Sagrada Comunhão”. que é muito diferente dos outros e que, por estranha anomalia, no manuscrito se intercala entre o segundo e o terceiro, rompendo a continuação temática.

O primeiro livro é de estilo mais conciso, austero, forte, de sentenças lapidares. Proclama a necessidade de seguir a Cristo, a nulidade dos valores humanos e das coisas terrenas (honras, ciência, prazeres, longevidade). Deve-se buscar a compunção do coração, a humildade, a obediência, meditar na morte, nos pecados, reformar a vida. É um manual de desenganos, com típica mentalidade monacal.

O segundo é um chamamento à interioridade: Regnum Dei intra vos est. Deve-se renunciar a todo conforto externo, não amar senão a Jesus e segui-lO pelo caminho real da Santa Cruz.

O terceiro são falas suavíssimas e penetrantes do Mestre interior ao discípulo, interrompidas com súplicas deste último. Exalta-se a abnegação, a vitória sobre si mesmo, a paciência, a humildade, a paz, a confiança e, sobretudo, o amor: “os admiráveis efeitos do amor divino”; se descrevem os sutis “movimentos da natureza e da graça”.

O quarto, sobre a devoção à Eucaristia, parece encerrar em si um tratado mais breve (c. 6-9), de preparação para a Comunhão.

A doutrina exposta por Kempis é enormemente positiva, profundamente evangélica, simples, sólida e maciça. Não se esqueça, no entanto, que foi escrita e concebida para religiosos e monges, razão pela qual alguns de seus conselhos não podem ser levados materialmente à prática pelos seculares. ainda que todos possam aproveitar de seu magnífico espírito transbordante de piedade.

Todo o livro está escrito em um latim claro, vigoroso e doce, com alguns germanismos ou neerlandismos e com frequência cadências rítmicas, com assonâncias e rimas; raras vezes se dilui em fáceis e floridas amplificações ou em reiterações afetuosas, que tanto abundam em outros escritos de Kempis.

Como é sabido, durante muitos anos se vem disputando sobre quem seja o verdadeiro autor do maravilhoso livro. Ele foi atribuído ao beneditino Jean Gersén († 1245), abade do Monastério de Santo Estevão de Vercelli; a Gerardo Groot, iniciador da Devotio moderna; a Jean Gerson, chanceler da Universidade de Paris e, finalmente, a Tomás de Kempis. A controvérsia, que não terminou ainda, vai se inclinando cada vez mais a favor do monge de Agnietenberg. Em todo caso, é questão que nada afeta a excelência intrínseca da doutrina. Como adverte o próprio Kempis:

“Não te mova a autoridade do que escreve, se é de pequena ou grande ciência; mas convide-te a ler o amor da pura verdade. Não olhes quem o disse; mas escuta o quê, tal como foi dito” (Imitação de Cristo I. 1, c. 5)

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